quarta-feira, 8 de agosto de 2012

Um carpinteiro à mesa 16:20 em ponto...


     Há no céu a lua grampeada no fundo negro. Um cenário montado para que possam protagonizar o ensaio de uma vida sem lembranças. Existe apenas o registro dos corpos bailando na penumbra, uma dança sensual que foi por muitas noites ensaiada...
     Algumas palavras dizem a verdade mesmo quando mentem, ou tentam... 
     A velha casa foi demolida e resultou num terreno baldio e sujo que apenas torna a alameda de belas e vistosas residências num paradoxo caótico. Apenas uma morada de vermes e pragas, pestes e insetos que os andarilhos ignoram, ao passarem pelos arbustos robustos.
     "Bailaram ali..."
     O titereiro largou ali seus brinquedos, dois corpos inanimados que não mais bailam juntos, nem separados. Aposentou-se. Guardou os bonecos e os sorrisos num canto empoeirado do seu armário, cortou as linhas de suas marionetes para dar-lhes liberdade.
     Acabaram-se ali as noites festivas, as conversas sem sentido e sem fim. Não há mais os murmúrios e aplausos dos espectadores. Não há sorrisos senão nostálgicos.
     Embreagado e arrependido, olha seus bonecos traindo e mentindo sem que seus narizes cresçam... por vontade própria vagam e fingem viver, afogando ou mascarando suas lembranças. Nômades sem vida fingindo não terem passado, vagando separados pelos bares, becos e pensões, bailando sozinhos desprovidos de graça, de esperanças, despidos e humilhados pelo próprio orgulho, dilacerados pela dor de uma escolha...
     Uma insígnia marcada na pele, ou membro de madeira que referia-se aos atores de uma ópera esquecida. Sim, na pele. A boneca tinha a crença de estar viva... Em seus movimentos leves e precisos, bruscamente demonstrava alguma humanidade, acreditando ser real sua exitência em algum lugar. E foi...
     O "Pinnochio" igualmente convencido, movia-se com ímpeto livre de suas amarras. vagando pela noite preta e sem estrelas... Onde estarão essas personagens complementares? ilustram um ambiente qualquer? fazem sorrir as crianças? alimentaram o fogo numa noite fria ou num preparo de um jantar à luz de velas?
     Há somente uma certeza, no que se refere aos astros de outrora. O titereio: o amor deixou-os. Livrou-os de suas amarras e não mais os controlam. Aprenderam a mentir e acreditar em suas próprias mentiras, uma vez que não tinham mais um ao outro; migraram em direções opostas e ambos, sim, ambos... vagueiam pelas noites sem fim, à espera do amanhecer, onde sempre acreditaram encontrar na aurora do dia que ainda não veio, o conforto e a realização do encontro com a "Fada Azul..."